De volta ao Espiritismo - conclusão
Logo na entrada, sou recebido por monitores uniformizados. Estão na entrada e em todos os pontos estratégicos, usando jalecos de cor roxa, sempre dispostos a ajudar. Eles me pedem que me dirija ao “Salão de Passes”, antes de qualquer coisa, e que deveria tomar uma enorme fila que se formava no grande hall de entrada. Era uma quinta feira, dia de feriado, e havia muitos milhares de visitantes e frequentadores. Mas a coordenação impecável dos monitores organizava essa fila, silenciosa e comportada, por longos corredores até o tal salão. O salão de passes era um lugar imenso, onde eu imagino caibam mais de 800 pessoas sentadas. Eu não chego a ficar 10 minutos na fila. Ela anda muito depressa, o movimento para entrar e sair do salão é contínuo, entra uma grande turma, passa por uma sessão de passes de mais ou menos 5 minutos e sai por outra porta, enquanto a turma seguinte entra. Tudo perfeitamente calculado. No interior do salão reina uma agradável penumbra; há apenas uma fraca iluminação indireta, proveniente de mortiças lâmpadas azuis de algumas luminárias na parte frontal. Essa fraca luz ilumina, relaxante, a grande parede frontal, onde há uma pintura representando Jesus no centro e o Dr. Bezerra de Menezes ao lado direito. Logo abaixo há uma fonte, com rochas e uma suave cascata d'água; um som muito harmonioso, junto com música (Ave Maria) baixa. Alguns monitores, estrategicamente posicionados nos corredores, orientam entrada e saída. Num microfone um senhor repete a cada minuto: “Entidades amorosas zelam por vocês. Vocês estão sendo agraciados ao entrar nesse recinto, com bênçãos de amor, paz e alegria...”.
Depois da sessão de passes, cada participante é encaminhado ao seu destino, conforme seus próprios objetivos no Centro. Em cada uma das muitas salas do edifício, são realizados os mais diversos trabalhos, voltados à necessidades específicas, como vários tipos de tratamentos. No meu caso, como queria conhecer, fui convidado a assistir uma palestra de Dona Guiomar de Oliveira Albanese, a legendária médium fundadora e dirigente do Centro.
Na segunda feira seguinte, lá estava eu, pouco antes do horário do iníco da palestra. Novamente, milhares de pessoas apinham a rua e as dependências do Centro. Ainda tive tempo pra conhecer a livraria, a lanchonete e a loja de conveniências. Só há uma palavra pra descrever todas essas instalações: Excelente! Estrutura de primeiro mundo. Produtos e atendimento de alta qualidade. Fico sabendo que a quase totalidade dos atendentes são voluntários. Trabalham graciosamente, sua única paga é o bem do próximo. E são muito bons no que fazem. Chega a hora do início da palestra, e eu me dirijo ao salão de palestras (ainda maior que o salão de passes, devem caber ali umas 1500 pessoas sentadas). Algo interessante aconteceu nesse dia: Havia fila para entrar no salão, e uma senhora “furou” na minha frente, na maior cara de pau. Imediatamente eu penso: “Que falta de educação!” Lá dentro, até pela ordem de entrada, nos sentamos lado a lado, e acabamos fazendo amizade. Ela acabaria me servindo de cicerone e guia do Centro, nas outras oportunidades em que eu lá retornei, me dando dicas e me apresentando a vários outros membros importantes.
Depois de alguma espera, ela entra, absolutamente idolatrada. Aplausos frenéticos. Muitos choram. A senhora ao meu lado chora. Lá está Dona Guiomar, comparada por muitos a Chico Xavier. Já idosa, quase 70 anos, sobe ao palco de um pulo. Cheia de energia, saúda a todos. Bem humorada, conta piadinhas. Canta. Todos cantam junto. Depois da música, finalmente, a palestra começa. Ela retira de uma pilha em cima de uma mesa uma folha de papel. E lê. É um bilhete que havia recebido: “Dona Guiomar, eu gostaria de saber se, como espírita, eu faria errado em beber álcool, só um pouquinho, socialmente, numa festa de Natal ou aniversário, por exemplo... Assinado, Fulano de Tal". A palestra seria em cima desse tema, então. Resposta: “Você, Fulano de Tal, como bom espírita, não deve jamais beber nada que seja alcoólico, nem um pouquinho, nem champanhe no Natal. Porquê? Porque quando se tratam de bebidas alcoólicas, o primeiro gole é seu, mas o segundo já não é mais. Tenha certeza que cada vez que você ergue um copo de cerveja, alguém (espírito) já está ao seu lado, pronto para usufruir desse prazer. E ele fará de tudo para que você beba mais e mais. Por isso é que cada um tem uma reação diferente quando fica bêbado. Um fica alegre, outro violento. Isso depende do obsessor que foi atraído. Se for um espírito violento, você se tornará violento. Se for um espírito triste, você se tornará depressivo...” E por aí vai. Ela lê ainda outras cartas, relacionadas a temas parecidos, vícios e fraquezas humanas. Mas a conclusão é sempre parecida.
Finalmente, minhas conclusões:
Espiritismo, eu gosto:
# Espíritas costumam demonstrar boa vontade no sentido de aceitar/conviver com tipos diferentes de fé (Embora esta não seja uma regra geral. Também existem espíritas "fanáticos").
# A história da origem do Espiritismo me agrada. Hyppolyte Leon Denizard Rivail, ou Allan Kardec, parece ter tentado realizar uma pesquisa científica verdadeira, e dentro das limitações da época em que viveu, organizar um sistema moral e ético justo e coerente com suas prerrogativas.
# Existem muitas e fortes evidências comprovadas em favor da teoria da reencarnação. Existem casos registrados em publicações médicas e científicas.
# Existem alegados casos de contatos entre espíritos e médiuns que ciência e parapsicologia não conseguem explicar.
# A pesquisa em T. I. (transcomunicação instrumental) vem se desenvolvendo em todo mundo, e aqui mesmo no Brasil temos um expoente nessa área, a pesquisadora Sônia Rinaldi.
# No caso do Centro Perseverança: Essa instituição mantém creche, programas de auxílio aos necessitados, promove diversas campanhas humanitárias, etc. Em todas as várias vezes que lá estive, em nenhum momento me foi pedido dinheiro. Todas as atividades se mantém por meio do patrocínio de simpatizantes e da iniciativa privada, pessoas que foram ajudadas, espiritualmente, e que agora se propõem a ajudar. Todos os "funcionários" do Centro são voluntários, e todos trabalham satisfeitos e parecem felizes. Isso para mim tem muita importância.
Espiritismo, não gosto:
# Apesar de ter começado com ideais científicos, o Espiritismo hoje é somente religião. Nada além disso. E com seus próprios dogmas. No que se refere aos contatos com o além, por exemplo, somos sempre advertidos de que, se não tivermos fé, não conseguiremos nada(???). Que tipo de ciência depende da fé? Se você pedir a um médium uma prova do seu poder de comunicação com os mortos, ele provavelmente vai exigir que você tenha fé, alguns (que eu conheci) até se ofendem diante de uma postura investigativa. Ora, se um fato é um fato, ele pode ser comprovado por A + B, independente de eu acreditar ou não.
# O Espiritismo, exatamente por esse caráter, da aceitação de princípios ditos científicos mas que não precisam ser comprovados, acaba se tornando um "paraíso" para charlatões. Qualquer pessoa pode sair por aí afirmando que mantém contato com mortos, e sempre vai ter quem acredite. Aqui no Brasil, então, com este nosso povo extremamente crédulo, a coisa vira uma festa. Haja vista minhas próprias experiências. Posso afirmar sem medo de errar que existem, atuando em falsos centros de Espiritismo, muitíssimos falsos médiuns, alguns por malandragem, outros talvez por pura insanidade.
# A teoria da evolução do espírito por meio do processo reencarnatório nunca me convenceu. Primeiro, pelo fato de nesse processo se perder a memória das vidas passadas. Automaticamente fica perdido o sentido de aprendizado. Isto é: Se eu não castigar meu cão logo que ele apronta a travessura, se eu deixar pra fazer isso no dia seguinte, quando ele já não se lembrar mais do que fez de errado, então ele nunca vai aprender. Segundo, pensar que teremos infinitas possibilidades de corrigir nossos erros, fatalmente provoca acomodação.
# Nos cursos que fiz e palestras que assisti, percebi que dentro do Espiritismo existe o hábito de se alterar os textos bíblicos e dos Evangelhos, para adequá-lo aos princípios de Kardec. Isso costuma funcionar com leigos, mas não comigo, que conheço esses textos no original, em hebraico, aramaico e grego (Essa é uma outra história).
# Conheço histórias de pessoas esquizofrênicas. Uma garota que conheci "ouvia vozes" e procurou o Espiritismo, onde foi aconselhada a "desenvolver sua mediunidade". Depois de sofrer por anos a fio, finalmente procurou um psiquiatra. Depois de uma semana tomando o medicamento adequado, todas as vozes desapareceram para sempre, e ela se libertou. Hoje é uma pessoa feliz e livre.
# Essa história de que somos induzidos a fazer o mal por espíritos obsessores... Não desce! Desculpe, Dona Guiomar, mas eu gosto de tomar minha cervejinha, às vezes, um copo ou dois, e tenho certeza de que ninguém "se apossa" de mim naquele momento. Conheço pessoas que tem problemas com álcool, mas posso garantir que isso não acontece por conta da influência de espíritos, mas sim porque eles tem uma predisposição genética a qualquer tipo de vício. São os adictos. A ciência explica...
Eu respeito o Espiritismo. E ainda mais os espíritas. São pessoas especiais, com muitas das quais eu me identifico. Acredito na possibilidade da reencarnação, mas me furto do apego a dogmas humanos. Acredito na possibilidade da comunicação com espíritos, em casos como este e muitos outros. Acredito nos trabalhos de pesquisa sério, como parece ser o caso de Sônia Rinaldi, reconhecido internacionalmente. Sempre acreditei nas melhores intenções do grande Chico Xavier. Mas não é da minha natureza aceitar nada que venha assim, pronto, e os rumos que o espiritismo anda tomando não me agradam.
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