15 dezembro 2006

Sexo e espiritualidade


Nesse post, vou abordar uma questão delicada. Eu não me permito ao luxo, aqui, de esconder partes, separar o que deve e o que não deve ser compartilhado, caso contrário minha tarefa estaria incompleta. Permito que você entre no meu íntimo e fique a vontade para usar o que lhe puder ser útil, e descartar o que não tiver utilidade.

Exatamente nessa fase, quando eu participava do grupo que descrevi no post anterior, eu comecei a me "encanar" um pouco com a questão do sexo. Eu vinha de uma fase relativamente longa, já de alguns meses, em completa abstenção sexual, só me dedicando ao Yoga, ao estudo do sagrado e à meditação. Sou um cara espiritualizado, sempre fui, mas sou de carne e osso e vivo no Brasil. Embora eu considere que nunca tenha sido um “devasso” também nunca deixei de ter minhas namoradas e aventuras.

Mas preciso ser sincero comigo e com todos aqui, e dizer que enquanto vivia esse período de abstenção, eu me sentia ótimo, ao contrário do que poderia até então supor. Eu me sentia mais lúcido, desperto... Sentia-me mais conectado com a minha intuição do que nunca. Eu tinha muitas pequenas “visões” que vinham a se realizar - coisas como sonhar com alguém que não via há anos, e encontrar esse alguém no dia seguinte, ou saber quem estava me ligando só de ouvir a campainha do telefone. Sim, essas coisas são comuns, acontecem com todo mundo, mas eu percebia que nessa fase tudo estava mais claro, muito mais forte, real, quase palpável. Eu tinha sonhos lúcidos, dos quais podia captar toques e dicas úteis, que acabava usando no meu dia-a-dia. As soluções para os meus problemas pareciam surgir espontaneamente em minha mente, como se eu estivesse mais conectado com o meu inconsciente (ou o inconsciente coletivo?) do que jamais estivera antes. Nas horas de meditação, então, eu parecia flutuar! Parecia-me que mais um pouco e sairia levitando pelo quarto. Nesse período tive outras experiências extremamente importantes, de foro íntimo, como aquela que descrevi no post “Samadhi”. E o sexo não me fazia falta! Algo para se estranhar, afinal eu era um homem jovem e saudável, habituado a uma vida sexual ativa.

E comecei a me questionar: Por que o sexo é tão importante em nossas mentes? Por que achamos que não pode haver prazer maior nesta vida? Por que o sexo, por vezes, nos torna obcecados? Por que amamos e adoramos todos os seus aspectos, inclusive (e por que não dizer principalmente) o que achamos mais "sujo", mais profano? Por que procuramos transcender a carne, justamente por meio da própria carne? Por que será que eu poderia perdoar a qualquer defeito, qualquer crime ou falha da minha amada, menos que ela seja ou mesmo tenha sido muito promíscua? Por que me é insuportável, no mais íntimo e sincero do meu ser, imaginá-la entregando-se a outros corpos? Por que associar símbolos sagrados ao ato sexual parece ser o pior tipo de blasfêmia que pode haver?

Por que o sexo é mais importante para uns que para outros? Para alguns é irresistível, para outros é perfeitamente controlável, como o desejo de comer açúcar, por exemplo. E numa pessoa dotada de grande sensibilidade, o prazer que o sexo dá, por questões que não cabem agora, será com certeza tanto mais apaixonante. A importância que damos ao sexo, em última análise, depende de nós, e não do sexo em si, como se ele fosse uma "entidade" independente. Há patologias e registros de dependência sexual de todo tipo, na história da medicina... Dr. Freud que o diga.

Esta opinião, de que não pode haver prazer maior nesta vida, com certeza será rebatida por muitos, especialmente os que se encontram já há muito tempo trilhando sendas espirituais. O prazer do sexo é subjetivo, como todos os prazeres carnais. Comer uma barra de chocolate, por exemplo, pode ser considerado um prazer incomensurável, sobretudo por um comedor compulsivo, e/ou viciado em açúcar. Esse mesmo prazer, no entanto, poderia ser analisado por outro indivíduo humano, de modos e hábitos menos vorazes, como uma sensação nem tão maravilhosa. Toda dependência traz sofrimento. Vício é uma doença também psicológica, como um "demônio" que intermitente perturba a paz do espírito, fazendo com que não consigamos pensar em mais nada.

Vício é algo que nos torna escravos. Pecado é o que nos impede se sermos livres (I Cor, 6, 12). A característica principal das doenças psicológicas que nos impedem de viver nossas vidas como queremos é a dependência, uma escravidão de si mesmo. Assim perdemos a noção do real, do mundo, das pessoas que nos cercam... Qualquer dependência, seja química ou psicológica, tem um ponto em comum: A perda da identidade, do poder sobre nossos próprios atos, uma espécie de auto hipnose destrutiva, que nos cega para o óbvio e o sensato.

Há um outro aspecto primordial no que concerne ao sexo humano, que o torna tão desejado e idealizado: O sentimento de entrega. A própria questão encerra, em si, sua resposta: “Transcendemos a carne, justamente por meio da própria carne”. É uma entrega profunda, despir-se de tudo que não somos, deixar cair, diante alguém, toda a fantasia e as máscaras que precisamos usar perante a sociedade. É como um grito de liberdade, é o momento em que podemos gritar como animais, gemer e rastejar, sem precisar manter uma pose. Para muitos, a imensa maioria dos indivíduos, é o único momento em que baixam a guarda. Comumente é, para estes, o único momento em que são eles mesmos.

Há ainda a questão do sentimento de estar se “dissolvendo” em outro. Naquele momento, trocando fluídos, estamos deixando de ser o que os outros imaginam que somos para nos tornarmos o que realmente somos. É uma rara oportunidade de dissolver o ego; neste caso, em outra pessoa. Claro que dissolver o ego no Todo é muito mais sublime. Mas, quem conhece esta Arte?

Obviamente o sexo, em si, não é uma força negativa, danosa ou nociva. Porém, será sempre potencialmente perigoso, na medida em que pode se tornar um vício. Talvez por ser o mais antigo e fácil (posto que é gratuito) vício da humanidade, a maioria das religiões o condenem, o façam impuro, imoral, imundo...

O sexo representa o oposto de tudo que é autocontrole, tudo o que “deve” ser, tudo aquilo que nos foi incutido como correto, sagrado e puro, desde a mais tenra idade. Também, sendo essencialmente carnal, é obviamente a representação mais perfeita de antítese do espiritual. Nem o beberrão, nem o glutão, nem o mentiroso, nem o ladrão, e nem mesmo o assassino, seriam pecadores tão impuros quanto os promíscuos, os lascivos, os que se entregam de corpo e alma à luxúria, porque este é o pecado cometido com o maior prazer. Em nenhum dos demais pecados, tornamo-nos tão completamente irracionais. Por meio da prática de nenhum deles é possível transcender o próprio ego, e em nenhum deles envolvemos outras pessoas...

Eu pensava e meditava tanto em tudo isso, por uma razão muito simples: Porque eu estava, como disse, muito bem sem o sexo. Todas as perfeições espirituais que eu buscava, lentamente, começavam a se fazer presentes em minha vida. E agora, justamente agora, surgia Hana em minha vida. Eu me apaixonei, mas hesitava em iniciar um relacionamento e perder tudo que estava ganhando com a minha dedicação exclusiva ao espírito.

O fim dessa história fica para a próxima segunda-feira, dia 18. Até!