30 novembro 2006

O Terceiro Pilar

Depois que entrei para o Vidya Yoga Ashram, iniciei uma fase muito produtiva para minha busca. Quando criança, eu meditava de um jeito espontâneo, inconsciente. Toda minha vida era meditativa, de uma forma perene. Depois que eu cresci, esqueci como viver assim, “perdi o jeito”, e tive que reaprender a Arte, como qualquer adulto que venha a se reinteressar por essas coisas.

Me entreguei totalmente a esse trabalho diário, dedicado e intensivo, de reconquista das capacidades perdidas. E o sucesso veio. Começei a me sentir muito bem em minha nova vida. Eu já tinha tentado ser vegetariano antes, sem muito sucesso, eu sentia falta da carne. Agora, sob a orientação carinhosa e profilática dos professores, eu conseguia me manter na dieta vegetariana sem problemas. Esse período coincidiu com uma fase bastante particular da minha vida: O fim de um relacionamento afetivo de anos, o que acabou por me levar, também, à abstenção sexual por um tempo bastante prolongado (algo tido como benéfico pela maioria das linhas do Yoga); uma coisa inédita em minha vida adulta.

Minha concentração no trabalho e em todas as tarefas diárias aumentava sensivelmente. Eu me sentia desperto, ao mesmo tempo em que experimentava uma grande serenidade. Resumindo, me sentia equilibrado. A prática da meditação, que eu nunca abandonei, agora era mais intensa, e os seus benefícios cada vez mais perceptíveis, em todas as horas do meu dia-a-dia. Eu me sentia profundamente realizado, como se a minha vida fosse perfeita, perfeitamente encaixada no grande contexto cósmico. E aqui cabe dizer que eu não tinha razões aparentes para me sentir assim. Minha situação financeira era sofrível - eu ocupava um cargo modesto numa pequena empresa de comunicação (o salário era uma piada), estava sem namorada e o meu lazer praticamente se resumia a levar minha filha de 10 anos para passear no parque aos finais de semana. Sendo assim, por que, exatamente, estou dizendo que "Tudo estava ótimo"?

Estou me referindo a um profundo estado interior de tranquila satisfação. Totalmente "ilógico", mas muito bom, e trazia resultados. Eu podia comprovar, na prática, que os estados de felicidade e alegria independem dos fatores externos. Quem se importa com o que é ou não lógico, quando se está feliz? As pessoas ao meu redor percebiam esse bem estar, essa serenidade, algo tão raro na nossa sociedade. Colegas no trabalho me perguntavam a respeito, queriam saber qual o “segredo”. Teve até quem viesse me pedir conselhos! No Ashram, eu me realizava. Ao final de cada aula, pouco antes do encerramento, eu me sentia como se me transportasse para alguma dimensão muito melhor do que a comum. Experimentava uma profunda consciência de unidade com o Universo (Pluriverso?), sentia uma paz que não podia simplesmente nascer de uma sequência de posturas e processos respiratórios. Era algo maior! E eu progredia rápido nas práticas. Penso que aprendemos rápido tudo de que gostamos muito, mas meu professor se impressionou, queria saber mais, e um dia me chamou para uma conversa, logo após a aula. Perguntou como estava me sentindo. Eu respondi que sentia harmonia interior e uma paz profunda ao fim de cada aula. E também um sentimento de Amor incondicional, arrebatador, por todas as pessoas e todas as coisas. Algo que eu já sentira antes, mas agora vinha acompanhado de grande serenidade.

(Eu já tivera experiências assim antes, de ser invadido por uma torrente de felicidade e amor incondicionais, ao meditar. Mas, depois de retornar ao estado mental ordinário, eu ficava desesperado, ansioso para contar pra todo mundo o que eu descobrira, o que eu "vira". Não me conformava em ver alguém sofrendo, porque eu sabia que não havia razão para isso, que havia um propósito maior para tudo, e que sofrer não fazia sentido. Eu queria gritar pra todo mundo, que se desapegassem de seus brinquedos ilusórios, temporários, fossem quais fossem, e que se dedicassem a amar cada vez mais, porque esse é o único caminho para a felicidade real!!!! - E o que acontecia? Uns me ignoravam, outros ouviam sem ouvir, outros ainda me achavam louco. Muito frustrante...)

Agora, essas experiências transcendentais maravilhosas continuavam acontecendo, cada vez com mais frequência, mas eu não mais me desesperava na tentativa de convencer os outros do que eu tinha "visto". Entendia que cada um vive em seu próprio tempo. E eu tinha que respeitar isso.

Eu vi os olhos do meu professor se encherem de água (ele era um cara tímido), e ele me disse: "Isso é muito bom! Que bom que você está conosco, e continue trabalhando!" Ele e sua esposa, os responsáveis por aquela unidade do Ashram Vidya Yoga se empenharam para eu me matricular no curso para professor (yogachária), o que me permitiria, depois de concluídos os estudos, me tornar o responsável por uma unidade. Mas o meu destino seria outro, como verão.

Comecei a ter “insights” impressionantes. Numa certa ocasião, eu me encontrava terrivelmente dividido, ao ter que fazer uma opção profissional, sem saber qual. Tentava fazer duas coisas ao mesmo tempo, e me desgastava demais com isso, sacrificando inclusive minhas horas de sono. A resposta veio da seguinte maneira: Depois de alguns minutos mergulhado em meditação profunda, pude “ouvir” claramente, dentro de mim, a seguinte afirmação: “Você não pode estar em dois lugares ao mesmo tempo – escolha onde vai querer estar, e faça o melhor que puder!”. Esta afirmação soou tão forte, que eu levei como que um “choque”! Anotei esta frase num caderno, para não esquecer nunca mais.


Devo deixar claro, aqui, que o Yoga me ajudou nesse processo, mas praticar não é como aprender uma espécie de “magia” que nos torna super-humanos. O Yoga é apenas mais uma ferramenta a ser utilizada na Busca, como qualquer outra. Os fatores que fazem a diferença são a sinceridade, a seriedade e a total entrega. Se encontrar a Verdade for realmente a coisa mais importante na sua vida, você alcançará resultados. Mas se você estiver preocupado com os imediatismos, com a grana, as glórias do mundo, as satisfações ou os prazeres carnais, mais do que com a Busca, então você continuará achando que só alguns caras especiais, superdotados, conseguem alcançar alguma coisa. O verdadeiro “dom” é querer. Enquanto isso não for possível ao buscador, ele só conseguirá continuar vivendo uma existência medíocre, cheia de sofrimentos por causa de ilusões ridículas, caindo e voltando a se levantar, para depois cair de novo, sempre nos mesmos erros... Quando a Busca é encarada como um “hobbie” ou um tipo de distração, algo pra se fazer nas horas vagas, o indivíduo tende a se perder em algum dos muitos desvios que aparecem nesse Caminho. Talvez ele se torne um pseudo-místico, um pseudo-esotérico ou simplesmente uma piada. Mas nunca encontrará a realização.

Este foi o terceiro Pilar que eu descobri: A sinceridade e a seriedade na Busca. Querer encontrar as respostas, mais do que qualquer outra coisa. Ter a sua escala de valores bem definida, pra você mesmo. Encontrar a Verdade deve ser, de verdade, a coisa mais importante de todas.