18 dezembro 2006

Sexo e espiritualidade - conclusão

Mais uma vez eu vivi o privilégio de comprovar, por mim e para mim, que realmente há mais na vida do que a rotina massacrante do dia-a-dia, a que infelizmente acabamos nos acostumando. Creio firmemente que somos assistidos, guiados. Creio numa Força maior, que trabalha constantemente a nosso favor, e que podemos encontrar nossas respostas e soluções, se procurarmos com verdade e discernimento. “Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e achareis; batei e abrir-se-vos-á; porque todos os que pedem, recebem; os que buscam, acham; e a quem bate, se abre.” (Mateus 7:7-11). Continue a leitura e entenda porquê...

Conforme descrito no post anterior, eu vivia um angustiante dilema interior sobre o papel do sexo na vida do buscador. Eu tinha a espiritualidade como prioridade na minha vida, mas mesmo assim, sou um ser humano comum, feito de carne e osso. Entenda-se que para mim, espiritualidade nunca foi sinônimo de alienação, de me desligar da realidade concreta das coisas. Espiritualidade para mim nunca significou pseudo-misticismo, bitolação... Na verdade, eu nunca fui do tipo que acredita em duendes :P...

Desde muito cedo percebi também que espiritualidade é uma coisa distinta de religião, embora na maioria das vezes as duas andem juntas. De um certo ponto de vista, poderia dizer que as diferentes religiões são meios para conduzir o ser humano à espiritualidade. Encontrar essa espiritualidade, para mim, significava encontrar o significado da vida, desvendar os segredos do Universo (só isso), alcançar as respostas para as questões fundamentais, como “Por que estou aqui? Quem sou eu? De onde vim e para onde vou? Há um Deus? Quem é Ele e o que quer? E, porque eu deveria me preocupar em saber o que Ele quer?”. O sentido de tudo, enfim, e outras coisas parecidas...

Interessante notar que a Psicologia clássica, hoje, admite que o ser humano, além de um “animal racional”, como tradicionalmente classificado pela biologia, também é um “animal emocional” e um “animal espiritual”. Isso é assim desde a era das cavernas. Mesmo no período da história humana em que as prioridades absolutas eram proteger a própria pele dos inúmeros e imprevisíveis perigos, e correr atrás (literalmente) do alimento que garantiria a sobrevivência por mais um dia, o homem já tinha consciência da realidade do Transcendente. Objetos e desenhos dos períodos pré-históricos que remontam à época do surgimento do homem na Terra, há cerca de 3,5 milhões de anos, encontrados abundantemente em escavações arqueológicas, demonstram que o homem, nesses períodos primordiais, já praticava rituais em honra a um Poder/Energia superior, que ele acreditava existir acima dele.

Mas então lá estava eu, um homem com um dilema na cabeça, procurando por uma resposta. Muitas vezes as respostas para essas questões internas e íntimas, dúvidas que surgem na minha mente e me perturbam por algum tempo, acabam surgindo como que espontaneamente, afloram em meio aos meus pensamentos, quando menos espero. Outras vezes, aparecem com toda clareza após uma sessão de meditação. Mas dessa vez isso não estava acontecendo. E eu não entendia o porquê. Essa questão era, com certeza, fundamental para o desenvolvimento da minha busca. Não que eu estivesse pensando em me tornar celibatário ou coisa que o valha, mas, como já dito, eu atravessava uma fase prolongada de abstinência que me trazia muitos bons frutos. Eu estava muito feliz assim, e agora podia até entender, de um jeito inteiramente novo, a opção dos monges e seminaristas. Ficar sem sexo, pela primeira vez na minha vida, não me parecia um grande sacrifício.

Mas qual o papel do sexo na vida de um buscador? Qual a sua importância, de que maneira devemos interagir/conviver com essa energia tão poderosa? De que maneira entender o sexo? Que tipo de valor ele têm? Será que deveria ser encarado apenas como meio de procriação, usado somente para “continuidade da espécie”? Ou eu deveria me liberar para curtir esse prazer à vontade, da maneira que bem quisesse, sem culpas ou medos?.. Estes eram os pensamentos de um cara chamado Henrique, há cerca de 7 anos, que não se conformava por não conseguir encontrar suas respostas tão esperadas. Então...

Num finalzinho de tarde de uma sexta feira, eu estava na região central da cidade de São Paulo. Tinha ido buscar minha futura esposa no trabalho, mas cheguei cedo, então resolvi dar uma voltinha pelas ruas próximas ao edifício onde ela trabalha. Passei em frente à livraria “Temos Livros”, na Av. São João, 526. É uma livraria pequena mas charmosa, tradicional na região central da minha cidade. Naquele exato momento, eu não estava pensando em nada em especial. No instante em que entrei na livraria, o fiz apenas por hábito (eu não consigo passar em frente a uma boa livraria sem dar uma entradinha, pra conferir as novidades...). Comecei a olhar as prateleiras, despreocupadamente. Antes que visse qualquer outra obra, um pequeno livro de capa vermelha, acomodado numa das prateleiras mais baixas, quase no nível do piso, me chamou a atenção: Olhei e vi que era de autoria do guru indiano pelo qual eu tinha um carinho especial, conforme já falei em outros posts: Paramahansa Yogananda.
Eu pego o livro, que eu ainda não conhecia, olho a arte da capa por um instante, e logo depois o abro. De primeira, abro na página 154, e imediatamente fixo meus olhos num dos seus últimos parágrafos. Bem, eu não vou falar mais nada. Meu relato de hoje termina aqui, e as conclusões deixarei a cargo dos meus possíveis leitores. Abaixo, a imagem da página em que eu abri o livro naquele dia, e a seguir, a transcrição do trecho que li, de pronto, como se a minha atenção tivesse sido atraída para ele.

Clique na imagem para ver maior. Sim, eu trouxe o livro pra casa.


“O sexo tem o seu lugar no relacionamento conjugal entre o homem e a mulher. Mas se ele se tornar o fator primordial desse relacionamento, o amor bate as asas e desaparece por completo. No seu lugar aparece então a possessividade, a familiaridade excessiva, os maus tratos, a perda da amizade e da compreensão. Embora a atração sexual seja uma das condições sob a qual nasce o amor, o sexo por si só não é o amor. O sexo e o amor estão tão afastados um do outro quanto o sol e a lua. Somente quando a qualidade transmutadora do verdadeiro amor é suprema na relação é que o sexo se torna um meio de exprimir o amor. Aqueles que vivem demasiadamente no plano sexual se perdem e não são capazes de encontrar satisfação no relacionamento conjugal. Por meio do auto controle, no qual o sexo não é a emoção determinante, mas apenas incidental em relação ao amor, é que marido e mulher podem saber o que é o amor real. Neste mundo moderno, infelizmente, o amor é quase sempre destruído por causa da ênfase exagerada que se dá à experiência sexual”.

Apenas uma pergunta: semelhanças entre este caso e o que descrevi aqui são mera coincidência?

15 dezembro 2006

Sexo e espiritualidade


Nesse post, vou abordar uma questão delicada. Eu não me permito ao luxo, aqui, de esconder partes, separar o que deve e o que não deve ser compartilhado, caso contrário minha tarefa estaria incompleta. Permito que você entre no meu íntimo e fique a vontade para usar o que lhe puder ser útil, e descartar o que não tiver utilidade.

Exatamente nessa fase, quando eu participava do grupo que descrevi no post anterior, eu comecei a me "encanar" um pouco com a questão do sexo. Eu vinha de uma fase relativamente longa, já de alguns meses, em completa abstenção sexual, só me dedicando ao Yoga, ao estudo do sagrado e à meditação. Sou um cara espiritualizado, sempre fui, mas sou de carne e osso e vivo no Brasil. Embora eu considere que nunca tenha sido um “devasso” também nunca deixei de ter minhas namoradas e aventuras.

Mas preciso ser sincero comigo e com todos aqui, e dizer que enquanto vivia esse período de abstenção, eu me sentia ótimo, ao contrário do que poderia até então supor. Eu me sentia mais lúcido, desperto... Sentia-me mais conectado com a minha intuição do que nunca. Eu tinha muitas pequenas “visões” que vinham a se realizar - coisas como sonhar com alguém que não via há anos, e encontrar esse alguém no dia seguinte, ou saber quem estava me ligando só de ouvir a campainha do telefone. Sim, essas coisas são comuns, acontecem com todo mundo, mas eu percebia que nessa fase tudo estava mais claro, muito mais forte, real, quase palpável. Eu tinha sonhos lúcidos, dos quais podia captar toques e dicas úteis, que acabava usando no meu dia-a-dia. As soluções para os meus problemas pareciam surgir espontaneamente em minha mente, como se eu estivesse mais conectado com o meu inconsciente (ou o inconsciente coletivo?) do que jamais estivera antes. Nas horas de meditação, então, eu parecia flutuar! Parecia-me que mais um pouco e sairia levitando pelo quarto. Nesse período tive outras experiências extremamente importantes, de foro íntimo, como aquela que descrevi no post “Samadhi”. E o sexo não me fazia falta! Algo para se estranhar, afinal eu era um homem jovem e saudável, habituado a uma vida sexual ativa.

E comecei a me questionar: Por que o sexo é tão importante em nossas mentes? Por que achamos que não pode haver prazer maior nesta vida? Por que o sexo, por vezes, nos torna obcecados? Por que amamos e adoramos todos os seus aspectos, inclusive (e por que não dizer principalmente) o que achamos mais "sujo", mais profano? Por que procuramos transcender a carne, justamente por meio da própria carne? Por que será que eu poderia perdoar a qualquer defeito, qualquer crime ou falha da minha amada, menos que ela seja ou mesmo tenha sido muito promíscua? Por que me é insuportável, no mais íntimo e sincero do meu ser, imaginá-la entregando-se a outros corpos? Por que associar símbolos sagrados ao ato sexual parece ser o pior tipo de blasfêmia que pode haver?

Por que o sexo é mais importante para uns que para outros? Para alguns é irresistível, para outros é perfeitamente controlável, como o desejo de comer açúcar, por exemplo. E numa pessoa dotada de grande sensibilidade, o prazer que o sexo dá, por questões que não cabem agora, será com certeza tanto mais apaixonante. A importância que damos ao sexo, em última análise, depende de nós, e não do sexo em si, como se ele fosse uma "entidade" independente. Há patologias e registros de dependência sexual de todo tipo, na história da medicina... Dr. Freud que o diga.

Esta opinião, de que não pode haver prazer maior nesta vida, com certeza será rebatida por muitos, especialmente os que se encontram já há muito tempo trilhando sendas espirituais. O prazer do sexo é subjetivo, como todos os prazeres carnais. Comer uma barra de chocolate, por exemplo, pode ser considerado um prazer incomensurável, sobretudo por um comedor compulsivo, e/ou viciado em açúcar. Esse mesmo prazer, no entanto, poderia ser analisado por outro indivíduo humano, de modos e hábitos menos vorazes, como uma sensação nem tão maravilhosa. Toda dependência traz sofrimento. Vício é uma doença também psicológica, como um "demônio" que intermitente perturba a paz do espírito, fazendo com que não consigamos pensar em mais nada.

Vício é algo que nos torna escravos. Pecado é o que nos impede se sermos livres (I Cor, 6, 12). A característica principal das doenças psicológicas que nos impedem de viver nossas vidas como queremos é a dependência, uma escravidão de si mesmo. Assim perdemos a noção do real, do mundo, das pessoas que nos cercam... Qualquer dependência, seja química ou psicológica, tem um ponto em comum: A perda da identidade, do poder sobre nossos próprios atos, uma espécie de auto hipnose destrutiva, que nos cega para o óbvio e o sensato.

Há um outro aspecto primordial no que concerne ao sexo humano, que o torna tão desejado e idealizado: O sentimento de entrega. A própria questão encerra, em si, sua resposta: “Transcendemos a carne, justamente por meio da própria carne”. É uma entrega profunda, despir-se de tudo que não somos, deixar cair, diante alguém, toda a fantasia e as máscaras que precisamos usar perante a sociedade. É como um grito de liberdade, é o momento em que podemos gritar como animais, gemer e rastejar, sem precisar manter uma pose. Para muitos, a imensa maioria dos indivíduos, é o único momento em que baixam a guarda. Comumente é, para estes, o único momento em que são eles mesmos.

Há ainda a questão do sentimento de estar se “dissolvendo” em outro. Naquele momento, trocando fluídos, estamos deixando de ser o que os outros imaginam que somos para nos tornarmos o que realmente somos. É uma rara oportunidade de dissolver o ego; neste caso, em outra pessoa. Claro que dissolver o ego no Todo é muito mais sublime. Mas, quem conhece esta Arte?

Obviamente o sexo, em si, não é uma força negativa, danosa ou nociva. Porém, será sempre potencialmente perigoso, na medida em que pode se tornar um vício. Talvez por ser o mais antigo e fácil (posto que é gratuito) vício da humanidade, a maioria das religiões o condenem, o façam impuro, imoral, imundo...

O sexo representa o oposto de tudo que é autocontrole, tudo o que “deve” ser, tudo aquilo que nos foi incutido como correto, sagrado e puro, desde a mais tenra idade. Também, sendo essencialmente carnal, é obviamente a representação mais perfeita de antítese do espiritual. Nem o beberrão, nem o glutão, nem o mentiroso, nem o ladrão, e nem mesmo o assassino, seriam pecadores tão impuros quanto os promíscuos, os lascivos, os que se entregam de corpo e alma à luxúria, porque este é o pecado cometido com o maior prazer. Em nenhum dos demais pecados, tornamo-nos tão completamente irracionais. Por meio da prática de nenhum deles é possível transcender o próprio ego, e em nenhum deles envolvemos outras pessoas...

Eu pensava e meditava tanto em tudo isso, por uma razão muito simples: Porque eu estava, como disse, muito bem sem o sexo. Todas as perfeições espirituais que eu buscava, lentamente, começavam a se fazer presentes em minha vida. E agora, justamente agora, surgia Hana em minha vida. Eu me apaixonei, mas hesitava em iniciar um relacionamento e perder tudo que estava ganhando com a minha dedicação exclusiva ao espírito.

O fim dessa história fica para a próxima segunda-feira, dia 18. Até!

13 dezembro 2006

O grupo "Satsanga Guruji"

Assim eu consegui, inesperadamente, o que tanto queria: Fazer parte de um grupo onde todos tinham os mesmos interesses que eu. E verdade seja dita: Nos dias de hoje, quando o assunto é espiritualidade desprovida de religião, encontrar quem se interesse é cada vez mais difícil.

Esse grupo, como disse no post anterior, era formado por 4 pessoas:

1 – Hana = Minha futura esposa, uma buscadora autêntica. Ela era (e é) uma mulher naturalmente espiritualizada, pura e amorosa, bem humorada e ao mesmo tempo séria na busca, com várias experiências em comum comigo. Ela também já tinha estudado Gnose, era uma seguidora da filosofia do Yoga e praticante de meditação transcendental. Ela era na época uma espécie de ”pós-hippie”, com um estilo assim meio despojado, do tipo que usa tênis all-star e jeans megadesbotados, mas com uma certa “chiqueza” natural, um jeito nobre de se portar, de andar, falar (ela me conquistou pela voz) – ô voz linda!.. Sempre carregando uma daquelas bolsas de crochê, feitas com cordão cru, com uma ou duas caixinhas de incenso e retratos de São Francisco dentro. Conhecedora de diversas disciplinas orientais e um ser humano altamente sensível. Desde a primeira vez que a vi, pareceu-me que havia uma espécie de luminosidade especial em torno dela.

2 – Roberto = Um dos yogues mais dedicados que eu já conheci em toda a minha vida. Um cara extremamente perspicaz, com duas universidades na bagagem e partindo para a formação acadêmica em Yoga. Apesar de ele ser o tipo de cara que muitas pessoas chamariam de pomposo (por causa do alto grau de erudição nos assuntos que nos interessavam, como Yoga, orientalismo e História antiga), depois de conhecê-lo bem, percebe-se que é uma pessoa extremamente humilde. Uma figuraça. Espero um dia ter a oportunidade de falar mais sobre ele.

3 – Beatriz = Na verdade, a pessoa de quem partiu a idéia e a iniciativa de formarmos um grupo. Era no apartamento dela que se realizavam as nossas reuniões e encontros. Versada também em Yoga (sua irmã é professora de Hatha) e iniciada em Krya, trazia uma bagagem de muitas vivências, inclusive internacionais, em instituições diversas. “Formada” no IIPC em projeção astral e uma verdadeira enciclopédia ambulante das diversas linhas de pensamento espiritual do oriente e do ocidente.

4 – Eu = Leiam os posts anteriores e saibam quem sou eu :D.

Como a base espiritual de todos nós era o Yoga, denominamos o nosso grupo de “Satsanga Guruji”: a primeira palavra, em sânscrito, quer dizer “boa companhia”, ou “comunhão espiritual”, e a segunda, era uma alusão ao querido guru Yogananda, já que, indiretamente, foi por intermédio dele que acabamos nos conhecendo.


Nos reuníamos sempre aos sábados. Fazíamos sessões de meditação coletiva, trocávamos livros, discutíamos sobre as diversas linhas espiritualistas e religiosas. Às vezes, um de nós trazia uma questão especial para o grupo, e o tema era desenvolvido em conjunto. Às vezes chegávamos a um consenso, outras não. Também fazíamos grandes planos para o futuro. Um deles era montar uma pousada em Parati, uma espécie de hotel e “spa” multifuncional, que agregaria relaxamento, Yoga, dieta vegetariana e meditação. Infelizmente, Beatriz, a única do grupo que possuía as condições financeiras para levar o projeto adiante, acabou mudando de idéia.

Esse período foi produtivo no sentido de aprender coisas novas e trocar experiências diretamente com outros buscadores, mas principalmente, me serviu para conhecer maneiras diferentes, de pessoas diferentes, de entender e interpretar a espiritualidade e o desejo de fazer o certo. Eu percebia que embora todos ali acreditassem em praticar o espiritualismo desprovido de dogmas ou religião, cada um tinha prioridades diferentes. Cada um acreditava em fatores totalmente diversos, como sendo os mais essenciais na Busca. Eu achava que o principal era manter o contato com o próximo. Tentar ajudar, do modo possível, a quem precisasse de ajuda. Fazer o bem, visitar orfanatos, casas de caridade, corredores de doentes graves nos hospitais e levar conforto aos desesperados, por exemplo. Essa era a idéia que eu tinha de prática espiritual perfeita. Praticar o verdadeiro Yoga, para mim, incluía necessariamente estar próximo do próximo.

Hana concordava comigo, mas Roberto e Beatriz discordavam. Achavam que para auxiliar quem quer que fosse, seria preciso primeiro alcançar a nossa própria perfeição. “Como podemos ajudar alguém, se nós mesmos ainda precisamos de ajuda? Quem somos nós para ajudar quem quer que seja? Isso é arrogância da sua parte...”

Eu acabava concordando, em parte, mas algo dentro de mim me dizia que a coisa não era bem assim...

Desse modo, Roberto e Beatriz preferiam aperfeiçoar seus corpos e mentes por meio de práticas yogues cada vez mais avançadas. Viviam refinando as suas técnicas respiratórias e as de purificação corporal. Dedicavam-se duramente ao treinamento de disciplina física. E se aprofundavam no estudo da vida e obra dos chamados grandes mestres, principalmente o Ramana Maharishi, de quem ambos eram devotos.

Ainda quero falar mais do Ramana, em momento oportuno, ele é um cara muito importante para a história da espiritualidade mundial. Falando de um jeito bem resumido, a doutrina do Ramana diz que o mais importante de tudo é você se conhecer, olhar para dentro de si mesmo, completamente “desarmado”. Esse seria o único meio de atingir a tão desejada iluminação, a única maneira de conhecer a “verdadeira Verdade”. Essa frase dele resume bem o conjunto dos seus ensinamentos:

A verdade de si mesmo é a única que vale a pena ser buscada e conhecida. Realização não é nada a ser adquirido. Ela está sempre aí, mas obstruída por uma tela de pensamentos. Realização é simplesmente a perda do ego. Destrua o ego pela procura da sua identidade. Uma vez que o ego não é nenhuma entidade, ele automaticamente desaparecerá, e a realidade irá brilhar por si mesma. Este é o método direto, enquanto todos os outros se concretizam somente através da retenção do ego”.

H K Merton resume ainda mais: “Destrua o ego e veja a Verdade”.

E aí? Bem, eu concordo com isso. Concordo totalmente e já tive o privilégio de comprovar isso na prática. Por isso o endereço do blog é “Sou Nada”. Esse “eu”, que é igual a nada, a que me refiro, é o ego, que precisa ser transcendido, ultrapassado, para que a verdadeira essência do ser apareça. Nosso verdadeiro eu encontra-se dentro de nós mesmos, em algum lugar lá no fundo, sufocado pelas ilusões e preocupações transitórias do mundo, e é preciso trazê-lo à tona. Existem vários meios para isso. Terapia é um (dos mais lentos). Meditação é outro, mas nem todos se dão bem com isso. Essa é outra longa história, que fica para uma outra ocasião.

O único (grande) problema que eu tenho com a doutrina do Ramana é exatamente este: Ele prega que ninguém pode ajudar ninguém, de fato, porque cada um deve buscar as próprias respostas, por si mesmo. Cabe a cada um a busca pela iluminação, que é uma realização pessoal e intransferível. Sim, isso é verdade, eu não posso abrir a cabeça de ninguém e enfiar lá dentro, à força, as coisas que eu já comprovei, por mim mesmo, como boas e verdadeiras. Mas o problema é que a maioria dos seguidores do homem acaba levando isso ao pé da letra, o que não acho legal. Um seguidor do Ramana, ao conhecer o meu blog, por exemplo, diria que o que eu faço aqui é inútil. Que eu tenho que seguir a minha própria busca e deixar cada um se virar por si mesmo. Eu reafirmo: Isso é verdade, mas só em parte.

Imagine se todos os buscadores se fechassem em si mesmos. Tudo seria muito mais difícil. A troca de experiências é importante. Mais do que isso, é vital! A experiência dos que já estão há mais tempo no caminho muitas vezes serve para auxiliar outros. Dizem que se conselho fosse bom não se dava de graça. Acho esse dito um dos mais imbecis que já inventaram! As melhores coisas da vida são de graça!! A começar pela saúde, a amizade, o amor de nossas mães ou o de nossos filhos... Posso dizer que já tive minha vida salva, literalmente, por seguir um bom conselho de um amigo sincero.

Além disso, se todos seguissem o princípio de “viver cada um pra si”, o que seria do Amor em nossas vidas? Amor, que a meu ver é o resumo de tudo...

Continua...

11 dezembro 2006

S R F

Agora volto ao tempo contínuo da minha narrativa.

Eu continuava progredindo bem na prática do Yoga, no Vidya Ashram. Mas sentia falta do lado devocional. Eu queria, eu precisava encontrar DEUS.

Falar em Deus, nos dias de hoje, suscita muita confusão. Vivemos uma época em que não existe um consenso do que vêm a significar essa palavra, e mesmo os que têm fé não concordam entre si, sobre como devemos nos comportar ou qual deve ser a nossa postura, enquanto buscadores, diante desse Deus. Claro que eu vou ter que explicar a maneira como eu entendo essa questão, muito claramente, e o farei em breve, assim que essa minha história terminar.

Deus era para mim fundamental. Estava feliz e satisfeito com a minha vida de yogue praticante, mas esse vazio ainda persistia. E eu também sonhava, já havia muito tempo, em fazer parte de um grupo em que todos pensassem como eu, compartilhassem os mesmos interesses, buscassem as mesmas coisas e pudessem entender as minhas angústias. O caminho do buscador tem fases muito solitárias... Eu queria encontrar a minha "turma"!

Mas, como eu disse antes, agora já existia uma coisa chamada "internet", que me trazia um novo e incrível mundo de possibilidades. Como a de encontrar e conhecer outros buscadores como eu. Eu sabia que eles existiam, que eram muitos, e que estavam perdidos por aí, querendo também encontrar outros como eles. Como eu.

Um belo dia, me lembrei do guru que para mim tinha sido a "porta de entrada" para esse novo e belo universo chamado Yoga: Paramahansa Yogananda. Teclei yogananda.com e assim descobri que havia um site dele em português, e através deste descobri que havia um grupo de meditação dirigido pela Self Realization Fellowship (instituição fundada pelo próprio Yogananda) aqui mesmo no meu país, e na minha cidade! Ali estava a oportunidade que eu procurava para agregar minha evolução técnica à parte devocional do Yoga. E quem sabe também encontrar, finalmente, o meu lugar. Foi só pegar no site o endereço e os horários de atividades da Self Realization Fellowship (daqui pra frente, SRF) aqui em São Paulo.

O lugar é uma espécie de "templo" adaptado em dois bonitos apartamentos num prédio no elegante bairro do Itaim Bibi. No 9º andar há uma grande sala onde se realizam, regularmente, três vezes por semana, sessões coletivas de meditação e exercícios de Krya Yoga (técnica exclusiva dos monges da ordem dos Swamis que são discípulos do guru Lahiri Mahasháya). No 7º andar funciona o escritório, e também uma espécie de loja onde se vendem incensos, livros, quadros e materiais relacionados à prática do Yoga, além de uma sala de práticas menor, onde acontecem aulas dominicais para os filhos dos membros, aos domingos.

A sala de meditação é um ambiente muito agradável, mantido sempre à meia luz, com quadros representando os "grandes avatares" e Jesus Cristo ao centro, num altar em estilo hindu. Uma bela moldura com a foto de Yogananda, momentos antes da hora do seu falecimento (que os hindus chamam de 'mahasamadhi' - a última vez em que um yogue abandona conscientemente o seu corpo físico para entrar definitivamente nos planos beatíficos) com um tranqüilo sorriso no rosto, ficava em lugar de destaque, sempre com grandes e lindos arranjos de flores aos seus pés.


Eu comecei a freqüentar a SRF, regularmente. Os dias de meditação coletiva aconteciam da seguinte maneira: Logo após as práticas de relaxamento iniciais, de curta duração (em torno de 15 minutos) as luzes eram diminuídas, pequenas velas eram acesas no altar e um dos alunos mais adiantados em Krya Yoga se posicionava diante de uma espécie de púlpito, de onde lia passagens de livros e/ou algumas máximas deixadas por Yogananda. Depois, todos cantávamos algum dos muitos (e belos) cânticos, de composição do próprio guru (com letras em português), acompanhados por um instrumento típico indiano que se parece com uma mistura de órgão e acordeom, que produz um som muito agradável. Ao final do cântico, que normalmente se encerrava com a diminuição do volume até o silêncio total, começava a sessão de meditação propriamente dita, com uma hora e meia de duração.

Eu passei bons momentos ali, e tinha toda a intenção de me iniciar em Krya, o mais rápido possível. Para se iniciar, é preciso seguir este processo: Enviar uma carta com um formulário preenchido e fotos, pedindo a iniciação, para a sede central mundial da SRF, que fica na Califórnia, EUA. Os Swamis mandam, de lá, lições via correio, para serem feitas casa, que devem ser seguidas pelo candidato ao pé da letra, em todos os detalhes. Concluídas as lições, o candidato se torna apto para um teste, e se passar, é iniciado em Krya, diretamente pelos monges, que visitam os países onde há filiais da SRF, em média, duas vezes por ano.

Tenho ótimas lembranças de todo o período em que participei das atividades da SRF com maior freqüência, mais ou menos uns dois anos. Me lembro, por exemplo, de quando participei da “Meditação Longa de Natal”, evento que é realizado todos os anos, num sábado, poucos dias antes da semana de Natal. Essa meditação especial começa às dez horas da manhã. Deve-se comparecer em jejum, levando frutas para depositar em grandes mesas que são colocadas nas entradas das duas salas, a do 9º e a do 7º andar. Ambas as salas são usadas para a meditação, e são inteiramente ornamentadas com flores e pétalas, e o retrato de Yogananda é substituído pela imagem de Jesus Cristo, em torno do qual se colocam colares de flores coloridas. Cada um se ajeita no lugar que lhe parece mais adequado. Alguns preferem o chão, outros as cadeiras. E é bom escolher bem, porque a meditação longa de Natal tem esse nome por um bom motivo: Ela dura 7 horas! Eu me sentei no carpete, sobre uma almofada, num lugar que me pareceu confortável. Depois de umas duas horas de meditação, começaram os sons do “khirtan” (música devocional, feita por grupos de músicos especializados em instrumentos tradicionais indianos, como cítaras e flautas). Hora de abrir os olhos e relaxar um pouco a postura de meio-lótus (ficar em "rája padmásana" - lótus completo, por 7 horas seguidas, não dá...). E só aí eu percebi que estava sentado bem em frente à atriz Lídia Brondi, uma devota fervorosa de Yogananda. Dez ou quinze minutos de cânticos, e mais duas horas de meditação. Assim prossegue o dia, até às dezessete horas, quando se encerra a meditação de Natal, com mais khirtan. Então, acontece uma grande confraternização, e todos se dirigem às mesas, para o fim do jejum, degustar as frutas trazidas, que formam grandes pilhas sobre as mesas delicadamente arrumadas.


Ali acabei fazendo grandes amigos, buscadores como eu, inclusive uma moça iniciada em Krya, chamada Beatriz. E foi assim que começou um grupo independente para pesquisa, estudos e troca de experiências, não só dos princípios relacionados ao Yoga, mas todas as formas possíveis de se praticar a espiritualidade. Esse grupo era constituído por essa Beatriz, um rapaz chamado Roberto, eu e a minha atual esposa (que eu acabara de conhecer, mas não lá). Cada um de nós possuía vivências e conhecimentos bastante aprofundados em diversos caminhos espirituais diferentes, e estes encontros se tornaram bastante produtivos para todos nós. Começamos a marcar reuniões aos sábados à tarde, onde trocávamos livros e vivências.

06 dezembro 2006

Projeção astral e EQM - conclusão

O que eu poderia concluir, depois de tudo que contei no último post?

É possível aprender alguma “técnica” para aprender a sair do corpo? Baseado em minha própria experiência, testemunhos que colhi e estudos aprofundados, que incluem entrevistas com diversos professores do IIPC, estou convencido de que a resposta é não.

Além disso, resolver essa questão de uma vez por todas na verdade seria muito simples: Ora, se alguém pudesse realmente se "projetar" no astral, na hora em que bem quisesse, isso não seria muito fácil de se comprovar através de uma experiência extremamente simples? Os que se autodenominam “projetores conscientes” afirmam que podem dar a volta ao mundo em segundos, estar em qualquer lugar que queiram com a velocidade do pensamento, quando libertos do corpo físico, certo? Então é tudo muito simples, em vez de ficar discutindo, tentando convencer as pessoas através de exemplos e teorias complicadas, bastaria alguém sair do corpo e dizer o que está acontecendo num outro lugar (como foi proposto naquele famoso programa "Globo Repórter", e nada aconteceu...).

Uma vez eu falei o seguinte pra um desses “projetores”: “Você quer que eu acredite? Eu vou te dar o meu endereço e explicar como chegar lá. Nós combinamos um dia e horário, você vai até lá em “corpo astral” e me diz o que eu vou estar fazendo naquela hora. Se você fizer isso, se você ao menos me disser qual é a cor da parede da minha sala, então eu acredito que você pode viajar no astral”. O gajo foi pego de surpresa. Hesitou um pouco, começou a mexer as mãos, nervosamente, depois sorriu amarelo: “Ah, mas é melhor você experimentar por si mesmo”...

Claro, a desculpa é sempre a mesma. E pra experimentar por mim mesmo eu tenho que pagar e fazer o curso, certo?.. Acho que se esse país fosse sério, essas instituições seriam fechadas e os responsáveis impedidos de continuar enganando as pessoas. Eu não costumo fazer afirmações aqui, quando se trata do imponderável. Mas esse assunto merece que eu abra uma exceção: Na minha opinião não existe esse negócio de "projetor consciente". Se existisse, isso já teria sido comprovado definitivamente, de forma inapelável, há muito tempo.

Mas e o fenômeno em si, existe? É real? Acredito que sim, por diversos e concretos motivos:

1. O testemunho de inúmeras pessoas idôneas e respeitáveis,

2. A imensa quantidade de casos relatados: entre 6 e 26% das pessoas ressuscitadas nas UTIs pelo mundo afora (isso é muuuuuita gente!), sendo que muitas eram declaradamente céticas, antes de passar por essas experiências),

3. Os vários pontos em comum entre todas as narrativas, mesmo antes da era da globalização, levou diversos neurocientistas à conclusão de que se tratam de mais do que mentiras ou delírios,

4. Em diversos casos, a morte cerebral permaneceu por um período de tempo que, clinicamente, impossibilitaria a continuidade das faculdades cerebrais normais, no caso de o indivíduo vir a se recuperar. Mas esses pacientes voltaram a vida normal depois de passar por uma experiência de EQM,

5. Este assunto foi uma espécie de tabu para os cientistas, até a virada do milênio. Hoje, sem ligar muito para a rejeição dos acadêmicos, vários cientistas dos EUA e Europa se propõem a estudar o fenômeno com metodologias sérias e 100% científicas,

6. Processos cerebrais que foram ativados durante eventos de uma EQM já foram detectados. Isso prova que algo real aconteceu com essas pessoas. Exemplo: Você está com fome e se depara com um prato com uma deliciosa fatia de lasanha aos 4 queijos, fumegante e perfumada, bem diante de você. Seu cérebro detona um processo que ativa as glândulas salivares e culmina na sua boca cheia “d´água”. Se você, no dia seguinte, novamente com fome, apenas se lembrar da lasanha, a salivação ocorre do mesmo jeito. Só de se lembrar. Então, a simples ocorrência do processo de salivação prova que você um dia saboreou essa lasanha, sabe que ela é gostosa, cheirosa, etc.

7. Experiências extracorporais incluem lembranças de fatos ocorridos enquanto os pacientes estavam desacordados. Por exemplo, um homem em coma atendido pela equipe do médico holandês Pim van Lommel teve a dentadura retirada. Acontece que essa dentadura foi perdida pela equipe médica. Mas o paciente reconheceu a enfermeira que lhe retirou a dentadura e disse que ela tinha guardado num carrinho de instrumentos cirúrgicos, coisa de que ela não se lembrava mais. E ele estava certo. Casos como esses são numerosos. Nós podemos escolher entre acreditar no fenômeno EQM ou não, mas é um fato que não há explicação satisfatória para casos como esses, a não ser a própria alegada "viagem" da consciência. Qualquer tipo de memória de um período em que a atividade cerebral for igual a zero é cientificamente impossível. E os casos estão aí.

Concluindo, eu acredito no fenômeno em si, mas também acredito que ele acontece quando deve acontecer, por motivos específicos, que nós não sabemos ainda como entender ou controlar.

Atualmente, a situação está no seguinte pé: O médico britânico Sam Parnia pretende provar, usando meios estritamente científicos, que a mente não depende do cérebro. Se bem sucedida, suas experiências podem vir a dissipar as controvérsias a respeito da EQM, através da observação objetiva: Seu estudo, que deve durar até 5 anos, envolverá 1500 pacientes na Inglaterra. Como as experiências extracorporais costumam ser narradas da perspectiva de quem flutua logo abaixo do teto, Sam vai posicionar telas de TV com seqüências aleatórias de imagens que só poderão ser vistas dessa posição. O ambiente será monitorado o tempo todo, assim como os sinais vitais do paciente no leito. Caso um paciente venha a identificar quais figuras foram projetadas durante sua morte clínica, estará provado que ele “voou” pela sala de cirurgia, já que a s imagens serão impossíveis de serem vistas de baixo.

Isso abriria um campo de estudos completamente novo para a ciência, que pressupõe que a mente e a consciência são produtos do cérebro, mas até hoje não explicou como um conjunto de circuitos elétricos pode gerar uma percepção individual do mundo e do próprio indivíduo.

Projeção astral e EQM - parte 2


A sigla I. I. P. C. significa “Instituto Internacional de Projeciologia e Conscienciologia”. Esse instituto supostamente se dedica ao estudo dos fenômenos espirituais, em especial as experiências de “desdobramento” ou “projeção astral” (ou ainda ‘viagem astral’). Esta foi a primeira organização a se criar, em solo nacional, voltada a esse tipo de atividade. Hoje, fazendo uma breve pesquisa no Google, podemos encontrar umas duas dúzias de similares. Não quero parecer maldoso, mas os motivos me parecem óbvios: a coisa dá dinheiro.

Quando você assiste a uma palestra de apresentação do IIPC, descobre que a única coisa gratuita ali é a própria palestra. Por uma hora e pouco, os caras tentam convencê-lo de que o fenômeno da projeção astral consciente é real. Quer dizer: todos temos a capacidade de abandonar o corpo biológico, em espírito (ou alma, atman, self, corpo sutil, corpo etéreo, etc...), que eles chamam simplesmente de "consciência", e sair voando por aí, à vontade, para onde quer que desejemos. Usando todo tipo de teorias, comparações e elucubrações mirabolantes, além de citações de casos diversos, tentam fazer a cabeça da assistência, para logo a seguir, oferecer um “curso de projeção”, no qual seria possível aprender todos segredos para se “projetar” à vontade.

Dominar essas técnicas significaria conquistar um poder incrível, o tipo de coisa com que se sonha quando criança, e que podemos ver, por exemplo, nos filmes do Harry Potter. Imagine estar aqui, agora, e no minuto seguinte poder estar passeando no Japão, ou então conhecer as pirâmides do Egito, ou apreciar o interior da Capela Sistina ou as obras do Louvre, por exemplo. E tudo de graça, afinal, o espírito não precisa de passagens ou ingressos para entrar onde quer que seja, além de ser, claro, invisível e indetectável. Quer saber se o presidente Lula sabia ou não das armações da turma do "mensalão"? Fácil: é só se “desdobrar” e ir fazer uma visita à Casa da Dinda, invisível, para ouvir as conversas. Algumas coisas que você iria ver e ouvir por lá, com certeza o fariam definir o seu voto, por exemplo. Imagine toda uma nação dominando esses poderes incríveis: Seriam os eleitores mais conscientes do mundo! Claro que isso também poderia ser usado para o mal, mas deixa pra lá...

Agora voltando ao planeta Terra, para participar desses cursos, é preciso pagar, e os valores não são nada accessíveis. Espiritualidade só pra quem pode pagar! O mais interessante de tudo é que eles afirmam que podem provar tudo o que alegam, mas preferem não fazê-lo! Por que? Fácil: Eles têm um lema, que seguem à risca: “Não acredite em nada do que estamos dizendo aqui. Faça os nossos cursos, aprenda as técnicas e comprove por si mesmo!”...

Legal, né? O único detalhe é que, como já disse, para fazer os cursos, é preciso pagar, e caro. Só por curiosidade e pra poder chegar a uma conclusão definitiva, eu participei de alguns desses cursos (eles acontecem em módulos) - E faço questão de quebrar o segredo e falar pra vocês como eles são: Os candidatos são colocados deitados em cima de colchonetes e induzidos a um relaxamento profundo, através de música suave e técnicas de alongamento e respiração. Depois de um tempo, o instrutor simplesmente pede a todos que se desliguem das sensações físicas e foquem suas atenções em suas consciências, e que tentem deixar seus corpos. Ele explica que é algo como dormir, mas mantendo a consciência ativa. Todos são deixados assim por um período de tempo determinado, que vai aumentando aula após aula. E é só isso. Claro que sempre tem uma senhorinha mais impressionável no meio da turma, que começa a chorar, no meio da prática, dizendo: “Oh! Acho que estou conseguindo! Eu saí do meu corpo!..” – O instrutor sorri e diz: “Parabéns! Continue assim!”... E o resto da turma logo se impressiona também: “Olha, ela conseguiu!”...

Isso é tudo. A grande maioria, que não consegue nada, é aconselhada a continuar com as práticas em casa, diariamente, que logo, logo, vão obter resultados. E se não conseguirem, é porque não estão fazendo direito, afinal, o processo não é assim tão fácil. Pergunta: “Mas na palestra disseram que era tudo muito simples, e que essas capacidades estariam ao alcance de qualquer pessoa!” – Reposta: “Sim, todos têm essa capacidade, mas uns encontram mais dificuldade para relaxar do que outros!”...

Bem, não preciso dizer o que eu acho de toda essa história de instituições e escolinhas para ensinar a “viajar” no astral... O que mais me choca nisso tudo é a credulidade das pessoas. A “galera” que freqüenta essas palestras e cursos parece que quer ser enganada! Como se acreditar nessas coisas funcionasse para elas como uma espécie de anestesia, um consolo para as dificuldades e decepções dessa vida... Muitos que vêm aqui devem conhecer a lista “Voadores”, por exemplo: Muito blábláblá e nada de confirmações concretas de tudo que é alegado. Acho triste.

Mas, e quanto ao fenômeno em si? Não é porque alguns irresponsáveis se valem desses artifícios para explorar a ingenuidade alheia, que devemos descartar toda e qualquer possibilidade da existência de casos reais de projeção extracorpórea. Minha própria esposa vivenciou uma situação de projeção consciente, quando ainda era adolescente. Ela viu o seu próprio corpo deitado, logo abaixo dela. E eu posso deixar aqui a minha palavra de que ela é uma pessoa idônea. Na verdade, uma das mais idôneas que eu já conheci em toda minha vida, incapaz de inventar uma história assim. Além disso, há os casos de EQM (Experiência de Quase Morte, quando um paciente permanece clinicamente ‘morto’ por um certo tempo, voltando depois à vida, contando que teve experiências místicas fora do corpo): Existem muitíssimos casos documentados de fenômenos ocorridos nesse sentido, muitos inclusive com celebridades nacionais. O velejador Lars Grael é um desses casos, o apresentador punk João Gordo (por incrível que pareça) é outro. No futuro, eu pretendo apresentar, em detalhes, alguns desses casos. Uma pesquisa feita em 1982 pelo Instituto Gallup dos Estados Unidos mostrou que aproximadamente 8 milhões de pessoas, ou 4% da população americana teria experimentado sensações físicas de quase morte! E quem seriam essas pessoas? Gente com boa saúde mental, o que elimina a possibilidade de delírios ou distúrbios, e de formação cultural e religiosa muito diversa, o que elimina a possibilidade de um fenômeno localizado em algum estrato social.

Mas dos casos ocorridos em nosso país, um dos mais famosos e respeitados, inclusive por pesquisadores internacionais, é o da radialista Cida Cavalcânti (capa da revista Superinteressante nº 216), que diz ter passado por 3 experiências de quase morte. A mais importante teria sido a ocorrida após um acidente automobilístico em 1994, no Estado de Santa Catarina. Ela afirma ter visto seu próprio corpo sendo resgatado após o desastre. Como ela também afirma que agora consegue se “desdobrar” na hora em que quiser, e “viajar no astral” à vontade, eu resolvi pedir ajuda a ela. Mandei-lhe um email, cujo conteúdo segue abaixo, na íntegra:

"Cara Cida,

Desde os quatro anos de idade eu tenho buscado pelo caminho da espiritualidade, desde que recebi, diretamente de minha mãe, a chocante informação de que nossas vidas não são eternas, inclusive a minha. Ao saber da fatalidade da morte, iniciei uma procura desesperada pelo Criador, aquele Deus absoluto de que todos falavam. (...) Essa busca parece não ter fim, e embora tenha sido repleta de felicidades, também me levou a muitíssimas frustrações. Escrevo porque (...) sempre me interessei pelo fenômeno conhecido como E.Q.M., e também pela chamada projeção extra-corpórea da consciência. Embora eu tenha vivenciado algumas experiências que não posso explicar, até hoje não consegui encontrar ninguém que pudesse realmente me dar informações dignas de crédito ou ao menos coerentes sobre o assunto. O que conheci foram instituições que me receberam com frases do tipo: “Sim, nós temos a chave para o ‘processo’. Basta fazer um pequeno ‘curso’ conosco, pelo qual o Sr. Pagará a módica quantia X e assim aprenderá as ‘técnicas’ e os ‘métodos’ que lhe possibilitarão se projetar conscientemente para fora do corpo físico, e ainda conhecer outros planos de realidade...”Quando pergunto se esses supostos ‘mestres’ teriam como ao menos tentar comprovar que estas experiências são reais (o que eu tenho certeza, seria muito fácil para alguém que realmente domina tais capacidades) tudo que ouço são evasivas, do tipo: “Experimente e comprove por si mesmo” – Uma postura bastante conveniente...Depois de tanto tempo nesta Busca, chega o momento em que começo a me desencantar com a idéia de que possam existir evidências da vida espiritual (...) Se na sua experiência você entendeu que deveria ajudar outras pessoas a encontrar a mesma paz que você encontrou, ajude-me. Basta uma palavra sensata e verdadeira. Isso é tudo que eu espero."


Para minha surpresa, a resposta veio nos seguintes termos:

Henrique, olá,

"Ajudar de verdade, não é passar a mão na cabeça e fazer cafuné. Às vezes, para ajudar, é preciso dar uma porrada na cara de alguém, para que essa pessoa acorde para a vida. Enquanto eu fiquei me sentindo vítima do mundo, me lamentando, eu era um horror de pessoa, triste, baixo astral. Precisei tomar uma porrada da vida para abrir os olhos, de fato, abrir a mente e o coração. Mas não creio que você queira um acidente automobilístico como eu tive: cair 50 metros de altura, fraturas na coluna e outras tantas escoriações para poder acordar para a vida.Em primeiro lugar, calma, controle a ansiedade. Eu só posso falar da espiritualidade pelas minhas vivências. Para mim, eu garanto que tem vida fora do corpo biológico. Mas eu fui buscar essas evidências experimentando, sim, por mim mesma. Só assim, eu tenho certeza de que é real, não é conversa de alguém. (...) você é quem deve buscar suas respostas. Eu acreditei em mim e nas minhas experiências, e não nas experiências dos outros. E pare de ficar procurando uma 'muleta' para se apoiar, querendo provar a existência de Deus. Daí você não consegue e fica frustrado. Não existe ninguém que tenha provado isso. E para que você quer provas? Para se sentir protegido? Por que você precisa de alguém ao seu lado para se sentir seguro? E por que, nessa idade, você não perdoa a sua mãe por ter te contado a verdade? Ou você preferia ter sido enganado por ela? Se você ficar procurando motivo pra drama na tua vida, você vai achar. Está na hora de olhar o lado positivo das coisas que te acontecem (...) E não fique esperando cair do céu todas as respostas prontinhas no teu colo. Vá atrás. Faça cursos, sim. É uma maneira saudável de obter conhecimento.E as respostas coerentes e dignas de crédito, que você menciona, e diz que não as recebeu, é porque quer todas de uma vez, e fica bravo se não te dizem o que você quer ouvir. Primeiro, paciência, rapaz! Vá buscar conhecimento nos livros (tem vários, muito bons), nos cursos, também. (...) Não fique esperando um “mestre” comprovar para você. Você diz que eles deveriam ter facilidade. O que é isso, Henrique??? Você está pensando que são mágicos de circo, que fazem aparecer e desaparecer coisas? Esse assunto é muito sério e Amparador nenhum doa energia para demonstrações públicas. Quem tem que buscar é você, com suas próprias experiências. E “postura conveniente” é a tua, de querer passar para os outros a responsabilidade de dar respostas para os teus questionamentos. Está mais do que na hora de amadurecer. Olhe no espelho; converse com a pessoa refletida lá e mexa-se!

Um abraço da Cida
."

Bom, pra quem já me acompanha neste blog há algum tempo, não preciso dizer que fiquei pasmo com essa reação. Se ela não tivesse citado o meu nome, eu iria imaginar que tinha enviado essa resposta para a pessoa errada, por engano. Afinal, ela está respondendo a uma série de perguntas que eu não fiz e me acusando de um monte de outras coisas que eu não sei de onde tirou!! Depois ela me aconselha a ler livros, fazer cursos, buscar por mim mesmo, sendo que eu já havia dito que isso é exatamente o que eu tenho feito, com a máxima seriedade, a minha vida inteira!!!!

Pois é, tudo que pedi foi uma resposta sensata, e isso foi tudo que não consegui. Bem, por algum motivo, ela parece ter se ofendido com as coisas que eu falei. E foi só a partir daí que, fazendo uma pequena busca na internet, descobri que ela própria também dá palestras e ministra cursos em instituições diversas...

A seguir a conclusão (não tente adivinhar qual será).

04 dezembro 2006

Projeção astral e EQM

Abro os olhos. É madrugada (A madrugada de um sábado para domingo, há uns dez anos – o que vou contar agora ocorreu pouco antes dos fatos narrados no post anterior). Tudo em volta está escuro, só a suave luminosidade de alguns raios de lua passam por entre as frestas da cortina, na janela do meu quarto. Estou deitado de barriga pra cima, olhando o teto, e estou sem sono. Completamente sem sono. Depois de um tempo “pensando na vida”, resolvo me levantar e descer (eu morava num sobrado) até a sala para assistir um pouco de TV, e talvez dar uma passada na cozinha antes, para um copo de água gelada. Foi então que algo muito estranho aconteceu:

Me levantei e fui até a porta do quarto, mas quando fui abri-la... minha mão simplesmente atravessou a maçaneta, como se ela (a mão) fosse feita de vapor! Desculpe-me por contar algo assim tão incomum com essa naturalidade, mas é o único meio que encontro. Eu estava ainda meio entorpecido, afinal tinha acabado de acordar, e talvez por isso não tenha me espantado tanto, na hora, como seria de se esperar. Tentei abrir a porta novamente, e aconteceu a mesma coisa: Minha mão parecia não mais constituída de matéria sólida, ela insistia em atravessar a maçaneta(!). De repente, senti um calafrio: de um estalo, compreendi que eu ainda estava dormindo, ou seja, eu deveria estar sonhando... Ou então, eu estava de pé, ali, em espírito, ou em “corpo sutil”, “corpo etéreo”, “duplo etérico”, ou como quer que prefiram chamar!
Pensei em me voltar e olhar para a cama, pra ver se o meu corpo continuava lá, deitado. Mas eu não sei explicar porque, tive medo de fazer isso. Ali, naquele momento, sozinho no escuro, eu não queria me virar para olhar o meu próprio corpo, separado de mim, como se eu estivesse morto. Hesitei por alguns minutos, sem saber o que fazer; mas não apavorado, apenas confuso. E então tive uma idéia insólita: Reclinei-me para frente, em direção à porta, até tocá-la com a minha testa. Aí, estiquei um pouco mais o pescoço para a frente, e... aconteceu algo ainda mais estranho: minha cabeça atravessou a porta, e eu fiquei assim, com a cabeça e uma parte do pescoço pro lado de fora do meu quarto, atravessando a porta fechada, e o resto do corpo dentro do quarto!!!

Contando isso, agora, não consigo descrever o quanto uma experiência como essas pode ser assustadora. É claro que eu já tinha lido muita coisa sobre experiências fora do corpo, desdobramento astral, EQM (Experiência de Quase Morte), e um montão de assuntos como esses, mas uma coisa é ler ou ouvir falar sobre, outra bem diferente é viver uma situação como essas. Nessa hora, sim, eu me apavorei, tentando entender o que estaria acontecendo, e o que veio a seguir foi algum tipo de “black out”; como se a “tomada” da minha consciência tivesse sido desconectada de repente. Logo depois, voltei a acordar, deitadinho na minha cama, como se nunca tivesse saído de lá, e tudo tivesse sido apenas um sonho muito realista. Ainda assustado, me sentei e esfreguei o rosto, tentando assimilar o que havia acontecido. Será que eu tinha me “desdobrado”? Depois de um tempo, o sono voltou, e eu dormi novamente.

No dia seguinte, eu me lembrava de ter visto, quando minha cabeça atravessou a porta e olhei para fora do meu quarto, a luz azulada da TV refletida na parede, no final das escadas. Do que só podia concluir que a TV estava ligada, na sala. Como naquele final de semana eu estava recebendo a visita do meu pai, logo que o vi, pela manhã, perguntei se ele tinha ido dormir muito tarde, na noite anterior. Ele respondeu que sim, que tivera dificuldades pra pegar no sono e que tinha ficado assistindo TV até de madrugada...

Eu não vou, aqui, me prestar ao trabalho de tentar convencer ninguém da veracidade dos fenômenos das experiências fora do corpo, nem nada desse tipo. Até porque, eu próprio não estou convencido, até hoje, de que tenha sido isso o que aconteceu naquela noite. Talvez tudo tenha sido, mesmo, apenas um sonho. Afinal, eu costumo ter sonhos curiosos. E sonho muito, com muita freqüência, e costumo me lembrar de tudo, depois. Basta cochilar no metrô, por 10 minutos, e de repente lá estou eu, esquiando na neve, saltando de pára-quedas ou brincando com peixinhos no fundo do mar... Mas que esse sonho foi meio diferente, eu reconheço. E esse foi o princípio do meu interesse maior por projeção astral e fenômenos afins.

Meu primeiro contato mais direto e mais aprofundado com o tema foi numa palestra do Profº Wagner Alegretti, o pupilo favorito do Profº Drº Valdo Vieira (ex-espírita, ex-médium, ex-“chapa” do Chico Xavier, pesquisador incansável dos fenômenos espirituais, em especial as capacidades projetoras do ser humano e fundador/diretor do I I P C - Instituto Internacional de Conscienciologia e Projeciologia). Assisti esta e várias outras palestras sobre o tema, com muito interesse. Cheguei a fazer alguns cursos no Instituto, cuja sede em São Paulo ficava na Av. Paulista. Conheci e troquei correspondências com a famosa Cida Cavalcânti, protagonista de um dos mais comentados casos de EQM ocorridos no Brasil, em todos os tempos (capa da revista Superinteressante de Agosto/2005), que afirma ser capaz de deixar o corpo físico a qualquer hora que queira. Sobre o que conversamos, o que eu aprendi sobre o assunto e quais as minhas conclusões a respeito desse tema, eu pretendo falar no próximo post. Afinal, você deve estar cansado dos meus textos gigantescos. Até.